Literatura Policial não é gênero menor, diz Raphael Montes
Literatura policial -- Ele tem apenas 26 anos, três livros
publicados e quase uma dezena de contos em antologias pelo mundo. O escritor –
e advogado – Raphael Montes já é considerado o responsável por dar um novo gás
à literatura policial nacional.
Todas as suas obras, editadas pela Companhia das Letras, já têm presença
garantida no cinema - “Mas ainda não sei quando, pois produzir cinema nacional
é demorado”. Também já foi elogiado por autores como o americano Scott Turow e
os brasileiros Walcyr Carrasco, João Emanuel Carneiro e Nelson Motta. Raphael
esteve em Salvador no início deste ano para lançar Jantar Secreto, seu mais
novo livro. Confira o bate papo com o escritor sobre
literatura e suas obras.
Na oportunidade, Rahpael Montes
concedeu a seguinte entrevista ao jornal A TARDE, que aqui reproduzimos na íntegra.
Você é considerado o responsável por dar um novo gás para a literatura policial brasileira. Isso é um peso para você, tão jovem?
Não acho um peso. Sempre gostei de literatura policial. Antes de ser
escritor, eu era – e ainda sou – leitor do gênero. Lia Agatha Christie, Conan
Doyle. Sempre me incomodava não ter uma literatura
policial no país. Não temos uma escola. Temos autores como Luis Lopes
Coelho, Patrícia Melo, Rubem Fonseca e Luiz Alfredo Garcia Roza, mas não existe
uma escola, como
tem fora do país. Sou um estudioso da literatura
policial. Entendo do gênero, não vou ter falsa modéstia. Fico feliz por dar
esse gás, ser o porta-voz. Mas não quero que seja uma voz gritando sozinha no
deserto. O que percebo, com alguma alegria, é que outras editoras estão
buscando autores nacionais do gênero, jovens com muita qualidade. Espero que
isso se multiplique e a gente forme uma escola de literatura policial no Brasil.
Por que a literatura policial ainda é considerada um gênero menor?
Por uma ideia burra defendida pela
academia arcaica, com cheiro de mofo, com traças, que acredita que, se a
literatura entretém, é subliteratura. O gênero policial trabalha com elementos
claros de entretenimento, o leitor mergulha na história, tanto que tem
elementos que chamam o leitor para se envolver na trama. Mas já está mais do
que provado que não
é um gênero menor pois há vários livros policiais que são literatura de
alto nível.
Em uma entrevista, você disse que a literatura na escola atrapalha mais do que ajuda a criar o hábito de leitura...
O erro das escolas é duplo. O
primeiro é obrigar a leitura. Na medida que você obriga, se torna uma
responsabilidade, algo chato para crianças e adolescentes. Quando é uma opção,
uma atividade, é interessante. Também tem que ter a sabedoria de escolher livros
que correspondam a determinadas idades. Eu li Machado de Assis com 15 anos e
serviu para mim. José de Alencar, li com 12, mas, com aquela linguagem
rebuscada, passei a não gostar do autor, talvez por esse resquício de memória.
Felizmente, algumas escolas estão mais modernas e escolhem autores
contemporâneos, pois os jovens se identificam com o autor.
Como surgiu a ideia para escrever Jantar Secreto?
Tinha vontade de falar um pouco
dessa geração de jovens que entra na faculdade achando que vai “ser alguém na
vida”. Foi algo que foi “vendido” para minha geração, de que você estuda, se
dedica e se torna algo na vida. A verdade é que o Brasil viveu um cenário de
prosperidade há alguns anos e, infelizmente, não se confirmou. Tem uma boa
quantidade de jovens que termina a faculdade, mas não tem emprego. Situação
muito atual. Jantar Secreto é um retrato desse nosso momento do país e surgiu
da vontade de questionar também o que a gente come. Por que nós comemos carne?
É uma área que me interessa, pois me tornei vegetariano. Isso tudo formou a
história do jantar secreto. A moralidade dos personagens vai ficando pelo
caminho. O livro narra a degradação desse grupo de quatro amigos. Isso é outra
coisa que me interessa, o quanto você vai abrindo concessões para determinadas
coisas da vida.
Nos seus livros, há sempre jovens angustiados, isso é um reflexo da juventude de hoje?
O que busquei em Jantar Secreto,
principalmente, foi representar os amigos como cada jovem de hoje em dia. Tem o
que quer se manter na linha e seguir em frente, o que é mais despreocupado, um
que não sabe o que quer da vida e outro, Dante, o protagonista, é o
responsável, mas a própria sociedade não facilita que ele conquiste os sonhos.
Todos têm uma moral que vai se deturpando. O Téo, de Dias Perfeitos, é um
psicopata, e o leitor não tem simpatia por ele. O Dante é humano, a gente
acompanha a humanidade dele e vai junto na história.
Você já foi traduzido para 20 países, como se sente em relação a isso?
Sou um escritor que não abre
concessões para ser lido. Não escrevo para agradar. Quando escrevo, torço para
agradar. O privilégio de ser traduzido em países como França, Espanha, Polônia
mostra que tem outras culturas também interessadas nessas histórias. Produzo
uma literatura que fala sobre o ser humano. São passados no Brasil, mas são
universais. Tento fazer um policial pop, com histórias contemporâneas e atuais,
com elementos gráficos fortes e viradas surpreendentes.
O que você tem escrito no momento?
Estou com três ideias de livro, mas
não sei qual vai adiante. Estou escrevendo as três e vou ver a que mais me
anima a continuar.
Fonte: A TARDE (Jornal de Salvador)
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